"Labirinto", do diretor Moacir Chaves, esteve em cartaz nos dias 7, 8 e 9 de setembro, no Porto Alegre em Cena, no Teatro do Ciee.
O espetáculo carioca reúne três textos - As relações naturais, A separação de dois esposos e Hoje sou um e amanhã outro - do célebre dramaturgo gaúcho Qorpo-Santo, todas mostrando a impotência do ser humano diante do paradoxo de uma estrutura social que o impede de viver de forma plena.
O encenador Moacir Chaves, um dos mais aclamados diretores do teatro brasileiro, busca explorar ao máximo as possibilidades cênicas dessas obras pouco montadas - mas que continuam contundentes e atuais, pois os personagens de Qorpo-Santo mostram homens em choque com suas pulsões e desejos, envolvidos pelas hipocrisias institucionais da sociedade. Para o público gaúcho, foi uma oportunidade ímpar de (re) ver e refletir sobre a obra desse extraordinário autor que desenvolveu seu trabalho aqui, em Porto Alegre.
Os três textos selecionados pelo grupo, escritos em 1866, demonstram o sentimento de inadequação do autor e sua consciência fragmentada, traço que se reflete na encenação - em que todos os atores fazem todos os personagens.
"As Relações Naturais" narra a desorientação de uma família diante do conflito entre os instintos e a moral vigente. "Hoje Sou Um e Amanhã Outro" revela a fantasia de um monarca justo, digno e misericordioso no Império do Brasil. "A Separação de Dois Esposos" traz o que talvez seja a primeira cena gay do teatro brasileiro, na trama em que um homem chamado Esculápio e sua mulher, Farmácia, mantêm um casamento de aparências.
O gênio louco
Tido como louco, o gaúcho que acreditava incorporar Napoleão III tornou-se um dramaturgo revolucionário. José Joaquim de Campos Leão, que adotou o nome Qorpo-Santo (1829 _ 1883) após uma das iluminações, ou transes, que dizia ter. Natural de Triunfo, Qorpo-Santo transferiu-se, em 1850, para Porto Alegre, onde criou um grupo de arte dramática. Ao todo, escreveu 17 peças, uma delas incompleta. Sua produção ganhou notoriedade a partir dos anos 1960, por iniciativa do jornalista Aníbal Damasceno Ferreira e do diretor teatral Antônio Carlos de Sena.
Em 1966, Sena levou a obra dele aos palcos, marcando a descoberta do autor por críticos como Yan Michalski, que disse tratar-se de um acontecimento que entraria para a história.
Apontado como um dos precursores do "teatro do absurdo", ao lado de dramaturgos como Beckett e Ionesco, Qorpo-Santo tem entre suas peças títulos como As Relações Naturais, Eu Sou Vida, Eu Não Sou Morte e Mateus e Mateusa. Em 1987, foi transformado, pelo escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, no protagonista do romance Cães da Província.
A costura da peça é muito bem feita. A proposta dos atores dobrarem os personagens dá ritmo e contribui na linha cômica das esquetes. O cenário simples, composto por mesas pretas e cadeiras brancas, distribuídas no palco, não compete com o elenco que usa figurinos da década 1960 e ocupa o espaço cênico sem deixar vazios.
Além do visual as músicas também são daquela década. Labirinto inicia e termina com Mercedes Benz, sucesso de Janis Joplin nos anos 60. O espetáculo utilizou destes recursos para lembrar, de uma maneira nada clichê, que o texto de Qorpo Santo foi redescoberto nesta época.
A Separação de Dois Esposos conta a história de um casal que tenta viver sob as “regras” impostas pela sociedade. Ele é funcionário público e ela dona de casa. A infidelidade e o prazer sexual vêm à tona nesta peça. As Relações Naturais é uma comédia em quatro atos onde um “lar” é transformado em bordel. As filhas são prostitutas, a mãe é a cafetina, e tem um caso com seu criado, e o pai é o cliente de suas próprias filhas. E Hoje Sou Um, e Amanhã Outro fala de governança pública e aborda questões bem atuais ao contar a história de um reino que sofre com a invasão de estrangeiros.
FCQS contatando o diretor Moacir Chaves para uma possível vinda do grupo a Triunfo.
Texto: Qorpo-Santo
Direção: Moacir Chaves
Elenco: Adriana Seiffert, Andy Gercker, Danielle Martins de Farias, Denise Pimenta, Diego Molina, Elisa Pinheiro, Fernando Lopes Lima, Gabriel Delfino, Gabriel Gorosito, Katiuscia Canoro, Leonardo Hinckel, Mariana Guimarães e Pâmela Côto
Figurino: Inês Salgado
Iluminação: Aurélio de Simoni
Cenário: Fernando Mello da Costa
Trilha sonora: Tato Taborda
Realização: Alfândega 88 Cia. De Teatro
Produção executiva: Danielle Martins de Farias, Diego Molina e Mariana Guimarães
FONTES:
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